31 de julho de 2010

Festim

Ouviu a Lua o grito?
Entre luzes e o escuro
Descubro sempre meu lugar

Aqui começa a queda
O salto para o mergulho
Um, dois, e já no ar

À imensidão, calado?
Vasto imenso receptáculo
De um Jardim primaveril

Ceifo pétalas, e danço!
E vôo, e canto, e grito
Fúnebre Noturno pueril

Que me importa, afinal
Se o teu gosto é agridoce
Pena, foste um cálido casulo

Não mais me prendo, nem piso
Ficas com tua inversa moral
Tua marca eu queimo, te anulo

E livre, consinto e bebo
O vinho que manchou teu leito
De vazios e leviandades

E devoro o tenro banquete
Que rasgou tuas outras vestes
Delicio-me com teu novo Hades

Pois sinto em meu corpo
O inverno quente e amargo
Mas é fácil adocicá-lo

Basta-me um outro salto
Um abraço à fria noite
É simples, e eu o calo

E ele morre, a cada sonho
A cada verso e cadência
A cada traço de nanquim

E eu alongo o meu hoje
Em braços que me levantam
E me atiram, novamente,
Ao meu mais novo festim.


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Escrito no Jardim, em 30/07/2010, às 03:20h,
"em silêncio".

Imagem: Ofélia, de Agnieszka Motyka.

28 de julho de 2010

Banalidades


Encho o peito de novos ares,
estes, cheio de aconchego
A caneca quente de café,
expia a falta de energia.

O sentimento da água quente do banho.
Purificação do corpo das imundices alheias,
ao meu corpo, a minha alma, alheias a mim.
Os olhos fechados me tornam feliz momentaneamente.

Nos pequenos prazeres,
nos momentos mais simples.
minha existência se desvela.
Quase posso perder-me.

Minha falta de sono,
minha falta de sonhos,
minhas ilusões são o que me restam.
Fecho os olhos na prece sem fé e automata.

Tenho na mente o fulgor dos pensamentos oscilantes,
porém eles nada me dizem.
O travesseiro cansado, o cobertor que começa a puir,
só falta o tempo passar, eu a esperar,
o outro dia nascer banal.

Em algumas cenas da consagrada série de House M.D., o protagonista Hugh Laurie (que vive o papel do doutor Gregory House) é visto tocando guitarra. Ao contrário do que alguns céticos podem imaginar, não se trata de um dublê em cena. O próprio ator é quem se incumbe do instrumento.

O astro britânico também toca piano, bateria e sax. Para quem ainda tem dúvidas sobre sua capacidade como músico, uma notícia. Ele acaba de assinar contrato com a gravadora Warner, para a gravação de um álbum de blues e demonstrou sua felicidade em declaração ao site americano aceshowbiz.

- Estou excitado com essa oportunidade. Sei que muitos atores que entraram no meio musical se deram mal, mas prometo que no meu caso ninguém sairá ferido. Estou emocionado de trabalhar com o produtor Joe Henry, que produziu alguns de meus discos favoritos.

Recentemente, Laurie participou, tocando piano, do álbum Hang Cool Teddy Bear, do roqueiro americano Meat Loaf, lançado em maio. Loaf postou no Youtube um vídeo com o ator tocando piano. O primeiro disco solo de Laurie ainda não tem previsão de lançamento. Abaixo um pouco desta parceria:




Fonte: R7

20 de julho de 2010

O Muro


Construí um muro
Nem grande
Nem pequeno
Discretamente o fiz

E parei calado
Diante do muro
Satisfeito
Perdidamente só

Pintei o muro
De vivo carmim
Que me disseram
Ser bem eficaz

E me pus sentado
Diante do muro
Surpreso
Era um cinza atroz

Pendurei no muro
Vasos, e flores
Que até se diziam
Únicas sob o Sol

E andei abismado
Diante do muro
Desiludido
No chão flores, mais mil

Reforcei o muro
Com espinhos e grades
Que me pareciam
Proteções perfeitas

E enfim esgotado
Diante do muro
Vulnerável
Um perfeito alvo

Não adiantam
Pedras e flores
Como um
Habilmente trançadas

Se fico para fora
Diante do muro
Construí um refúgio
Inutilmente o fiz


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Escrito em 17/07/2010, na terra sem ar.

16 de julho de 2010

O Cemitério de Gaiman


Neil Gaiman lança no Brasil pela editora Rocco no selo Jovens Leitores, O Livro dos Cemitérios, uma história que lança um olhar mágico e surpreendente, em um universo já conhecido por seu terror, mas nunca por sua essência.

Ninguém Owens, antes de assim ser chamado, era um bebê bem ativo que não fazia ideia do que lhe esperava. Em uma noite nevoenta, um homem chamado Jack entra em sua casa, mata seus pais e sua irmã mais velha e deixa o último membro da família escapar. O pequeno garoto, sem saber do que acontecia, vê a porta aberta e foge para o cemitério próximo de casa, um lugar repleto de fantasmas que o adota e protege. Assim “nasce” Ninguém Owens, ou Nin, ou o menino vivo.

Mas o lugar não é um simples cemitério assombrado. Ele é mágico. Nin tem a liberdade de poder andar por onde quiser entre os limites do solo sagrado, podendo inclusive desaparecer e passar pelas paredes. O que o diferencia dos outros moradores do lugar é a sua condição de vivente. Lá dentro ele cresce, é educado por Silas, seu guardião misterioso que também não pertence àquele lugar. Em meio a histórias contadas pelos fantasmas, ele se transforma em um garoto curioso e querido por todos que lá vivem. Um lugar que mete medo em muitos é aquele que o protege dos perigos de fora.

Cada capítulo de O Livro do Cemitério mostra Nin em tempos diferentes vivendo várias aventuras. Há um fino fio que liga diretamente um capítulo ao outro, que superficialmente parecem ser histórias separadas. Mas o perigo sempre ronda o protagonista, e no fim esses vários elementos tratados durante a trama se unem transformando o desfecho da história de Nin em algo único. O garoto é encantador, mostrando ser mais sensato que muitos adultos, tendo um pensamento aguçado e sincero por ter crescido em ambiente tão diferente. Ele é mágico, assim como o lugar onde vive.

Gaiman faz o leitor simpatizar instantaneamente pelo protagonista e os fantasmas que vivem com ele. Narrando de forma simples e detalhando apenas o principal para montar os cenários, ele utiliza formas de linguagem pertinentes à época em que cada fantasma viveu e familiariza o leitor com o cemitério detalhando inclusive as lápides de cada personagem importante para a trama. Por mais fantasiosa que a história possa ser, Gaiman faz parecer que tudo poderia ser realmente real.

O Livro no Cemitério convida a explorar não só a história de Nin, mas o mundo onde o próprio leitor vive. É isso o que o garoto faz durante toda a trama, e é essa a mensagem que Neil Gaiman deixa no final. Aproveitar enquanto se é vivo para conhecer tudo o que está ao alcance e tentar chegar àquilo que não está. O livro encanta por tratar de forma tão leve e bem humorada um assunto como a morte, e ainda traz boas passagens fantásticas que misturam o real ao imaginário onde tanto a trama quanto as personagens cativam.

Assim como fez em Coraline e Os lobos dentro das paredes, Neil Gaiman cria um mundo fantástico e fascinante, desta vez dentro de um pequeno cemitério. Ninguém e seus companheiros de cemitério são personagens adoráveis e mesmo os mortos são cheios de vida e alegria como raramente se acha em outros livros. Mais uma vez com o acompanhamento de luxo das belas (e sombrias) ilustrações de seu velho colaborador Dave Mckean, Gaiman apresenta um livro estupendo. E fica claro porque é um dos mais badalados escritores da atualidade.

Retirado na íntegra de Ambrosia, com alterações.

Outras fontes: Livrorama

8 de julho de 2010

Sublime Sabor


Me desnudo ante a você.
Farto-te de minha luxúria incontida,
Meus lábios buscam, e sem pudor,
descobrem sua pele.
Sublime sabor.

Oferto meu seio,
meu desejo mais puro.
Honro o teu querer.
Como uma deusa vinda de longe,
pássaro migrante em busca de calor.
Sublime sabor.

Rosto, olhos, corpos.
Meus olhos nos teus, deleite.
Negligente do mundo,
Abandono da dor.
Sublime sabor.

Ao fim o âmago profundo,
sentimento doce este,
o toque do teu ser,
almas insanas e apaixonadas.
Mel de gozo e amor.
Sublime sabor.

5 de julho de 2010

Manuel Bandeira

Conheci Manuel Bandeira através do Nino, sim aquele simpático aprendiz de feiticeiro, sobrinho do Dr. Vitor e da Bruxa Morgana. O que me chamou a atenção é a sonoridade, como se ele criasse vida, e a cena se desvela a sua frente:

Trem de Ferro

Café com pão
Café com pão
Café com pão

Virge Maria que foi isso maquinista?

Agora sim
Café com pão
Agora sim
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força
(trem de ferro, trem de ferro)

Oô...
Foge, bicho
Foge, povo
Passa ponte
Passa poste
Passa pasto
Passa boi
Passa boiada
Passa galho
Da ingazeira
Debruçada
No riacho
Que vontade
De cantar!
Oô...
(café com pão é muito bom)

Quando me prendero
No canaviá
Cada pé de cana
Era um oficiá
Oô...
Menina bonita
Do vestido verde
Me dá tua boca
Pra matar minha sede
Oô...
Vou mimbora, vou mimbora
Não gosto daqui
Nasci no sertão
Sou de Ouricuri
Oô...

Vou depressa
Vou correndo
Vou na toda
Que só levo
Pouca gente
Pouca gente
Pouca gente...
(trem de ferro, trem de ferro)


Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho, mais conhecido como Manuel Bandeira nasceu em Recife no dia 19 de abril de 1886, tendo-se mudado em 1890 para o Rio de Janeiro e depois para Santos-SP, voltando novamente para o Rio de Janeiro.
Cursou em 1896 o Externato do Ginásio Nacional (atual Colégio Pedro II), em Pernambuco. Em 1903, a família se muda novamente para São Paulo e ele cursa a Escola Politécnica com intuito de se tornar arquiteto. Trabalha ainda nos escritórios da Estrada de Ferro Sorocabana, da qual seu pai era funcionário.
No ano de 1904 descobre-se acometido de tuberculose e abandona tudo, voltando ao Rio de Janeiro em busca de um clima melhor, nesta busca passa várias temporadas em diversas cidades: Campanha, Teresópolis, Maranguape, Uruquê, Quixeramobim.
Participa 1910 de um concurso de poesia promovido pela Academia Brasileira de Letras, mas não conseguiu sucesso. Foi nesta epóca que entra em contato com as rimas toantes de Charles de Guérin, empregando-as em "Carnaval".
Em 1919, sob influência de Apollinaire, Charles Cros e Mac-Fionna Leod, escreve seus primeiros versos livres.

Durante tratamento no Sanatório de Clavadel, na Suíça, no ano de 1913, onde entra em contato com Paul Eugène Grindel e Gala.
Com a eclosão da 1ª Guerra Mundial, em 1914, volta para o Brasil em outubro. Neste período entra em contato através da leitura com Goethe, Lenau e Heine.
Em 1916 falece sua mãe, e já no ano seguinte ele publica "A cinza das horas", edição de 200 exemplares custeada pelo autor.
A morte de sua irmã, que o ajudará em sua doença ocorre em 1918. No ano seguinte Bandeira publica seu segundo livro "Carnaval", em edição custeada pelo autor. Este livro desperta entusiasmo nos iniciadores do modernismo.
Em 1920 morre seu pai, e o poeta se muda de sua antiga rua para a Rua Curvelo, 53 (hoje Dias de Barros), tornando-se vizinho de Ribeiro Couto. Numa reunião na casa de Ronald de Carvalho, em Copacabana, no ano seguinte a morte de seu pai, conhece Mário de Andrade, na ocasião também estavam presentes Oswald de Andrade, Sérgio Buarque de Holanda e Osvaldo Orico.

Embora não tenha participado da Semana de Arte Moderna, Ronald de Carvalho lê o poema "Os Sapos", de "Carnaval". Após este momento torna-se ativo escritor, crítico e tradutor.
Em 1940 é eleito para a Academia Brasileira de Letras, na vaga de Luís Guimarães Filho, tomando posse em 30 de novembro. Publica "Poesias Completas", com a inclusão da "Lira dos Cinquent'Anos", custeado pelo autor. Publica também "Noções de História das Literaturas" e, em separata da "Revista do Brasil, A Autoria das Cartas Chilenas".

Manuel Bandeira continua ativo em seu ofício, sempre recebendo homenagens. Em 1966, aos 80 anos, a Editora José Olympio realiza em sua sede uma festa e lança os volumes "Estrela da Vida Inteira (poesias completas e traduções de poesia) e "Andorinha Andorinha" (seleção de textos em prosa, organizada por Carlos Drummond de Andrade). Neste perído, adquiri sua casa em Teresópolis, a única propriedade que teve ao longo de sua vida.
Seus problemas de saúde, Manuel Bandeira deixa seu apartamento da Avenida Beira-Mar e se transfere para o apartamento da Rua Aires Saldanha, em Copacabana, de propriedade de Maria de Lourdes Heitor Souza, sua companheira nos últimos anos.
No dia 13 de outubro de 1968, Manuel Bandeira morreu, sendo sepultado no Mausoléu da Academia Brasileira de Letras, no Cemitério São João Batista.

OBRA:

Poesia:

- A Cinza das Horas - Jornal do Comércio - Rio de Janeiro, 1917 (Edição do Autor);


- Carnaval - Rio de janeiro,1919 (Edição do Autor);


- Poesias (acrescida de O Ritmo Dissoluto) - Rio de Janeiro, 1924;

- Libertinagem - Rio de Janeiro, 1930 (Edição do Autor);

- Estrela da Manhã - Rio de Janeiro, 1936 (Edição do Autor);

- Poesias Escolhidas - Rio de Janeiro, 1937;

- Poesias Completas (acrescida de Lira dos cinqüent'anos) - Rio de Janeiro, 1940 (Edição do Autor);

- Poemas Traduzidos - Rio de Janeiro, 1945;

- Mafuá do Malungo - Barcelona, 1948 (Editor João Cabral de Melo Neto);

- Poesias Completas (com Belo Belo) - Rio de Janeiro, 1948;

- Opus 10 - Niterói - 1952;

- 50 Poemas Escolhidos pelo Autor - Rio de Janeiro, 1955;

- Poesias completas (acrescidas de Opus 10) - Rio de Janeiro, 1955;

- Poesia e prosa completa (acrescida de Estrela da Tarde), Rio de Janeiro, 1958;

- Alumbramentos - Rio de Janeiro, 1960;

- Estrela da Tarde - Rio de Janeiro, 1960;

- Estrela a vida inteira, Rio de Janeiro, 1966 (edição em homenagem aos 80 anos do poeta);

- Manuel Bandeira - 50 poemas escolhidos pelo autor - Rio de Janeiro, 2006.

Prosa:

- Crônicas da Província do Brasil - Rio de Janeiro, 1936;

- Guia de Ouro Preto, Rio de Janeiro, 1938;

- Noções de História das Literaturas - Rio de Janeiro, 1940;

- Autoria das Cartas Chilenas - Rio de Janeiro, 1940;

- Apresentação da Poesia Brasileira - Rio de Janeiro, 1946;

- Literatura Hispano-Americana - Rio de Janeiro, 1949;

- Gonçalves Dias, Biografia - Rio de Janeiro, 1952;

- Itinerário de Pasárgada - Jornal de Letras, Rio de Janeiro, 1954;

- De Poetas e de Poesia - Rio de Janeiro, 1954;

- A Flauta de Papel - Rio de Janeiro, 1957;

- Itinerário de Pasárgada - Livraria São José - Rio de Janeiro, 1957;

- Prosa - Rio de Janeiro, 1958;

- Andorinha, Andorinha - José Olympio - Rio de Janeiro, 1966;

- Itinerário de Pasárgada - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1966 ;

- Colóquio Unilateralmente Sentimental - Editora Record - RJ, 1968;

- Seleta de Prosa - Nova Fronteira - RJ;

- Berimbau e Outros Poemas - Nova Fronteira - RJ

Antologias:

- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Romântica, N. Fronteira, RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Parnasiana - N. Fronteira, RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Moderna - Vol. 1, N. Fronteira, RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Moderna - Vol. 2, N. Fronteira, RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos, N. Fronteira, RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros - Poesia Simbolista, N. Fronteira, RJ
- Antologia Poética - Editora do Autor, Rio de Janeiro, 1961
- Poesia do Brasil - Editora do Autor, Rio de Janeiro, 1963
- Os Reis Vagabundos e mais 50 crônicas - Editora do Autor, RJ, 1966
- Manuel Bandeira - Poesia Completa e Prosa, Ed. Nova Aguilar, RJ
- Antologia Poética (nova edição), Editora N. Fronteira, 2001

Em conjunto:

- Quadrante 1 - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1962
(com Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Dinah Silveira
de Queiroz, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga)

- Quadrante 2 - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1963
(com Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Dinah Silveira
de Queiroz, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga)

- Quatro Vozes - Editora Record - Rio de Janeiro, 1998
(com Carlos Drummond de Andrade, Rachel de Queiroz e Cecília
Meireles)

- Elenco de Cronistas Modernos - Ed. José Olympio - RJ
(com Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga

- O Melhor da Poesia Brasileira 1 - Ed. José Olympio - Rio de Janeiro
(com Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto)

- Os Melhores Poemas de Manuel Bandeira (seleção de Francisco de
A. Barbosa) - Editora Global - Rio de Janeiro)

Seleção e Organização:

- Sonetos Completos e Poemas Escolhidos de Antero de Quental
- Obras Poéticas de Gonçalves Dias, 1944
- Rimas de José Albano, 1948
- Cartas a Manuel Bandeira, de Mário de Andrade, 1958.

Os Sapos

Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.

Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.

Vai por cinquenta anos 
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A fôrmas a forma.

Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas..."

Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei!"- "Foi!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".

Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- A grande arte é como
Lavor de joalheiro.

Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo".

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".

Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;

Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...


Fonte: Releituras

            Casa do Bruxo

4 de julho de 2010

Insônia

Vê! Lá vai o mesmo
A sombra, a fraca névoa
Mal se sustenta, mal enxerga
Não dorme, não anda, não come

Passam-se os anos
Passam os olhares
Passam os braços, abraços
E mais um,  e mais outro
E nada fica

Ouve, como ele é silente!
É quase pelo vento levado
Já nem os olhos ergue
Já nem os gritos escuta
Não, ele preferiu o silêncio
Ele fingiu não sentir dor

Em mais outro leito
O corpo retorce
Grita com as paredes
Em outro gigante leito
A fantástica tragédia continua

Olha, dá pra ouvir a arritmia!
Quase parando, caindo, se afogando
Mas ele não sente?
Nem agora, ele sente?
Talvez... já parou, e ele anda

Um novo pesadelo, nós temos
Oh sim, chega de quinquilharias
Pra quê chaves ou mesmo orquídeas
Quando ao dormir, nós temos
Um perfume que não é nosso?

As mãos param, os pés param
Ainda o chão ele olha
Como pôde, como pôde, como pôde
Suicidar-se com a mesma faca
Atirar-se no mesmo abismo
Beber do mesmo veneno
Como pôde ele enfim
Despertar o maldito sonhador?

Mas é claro, nós perdemos
Nosso lar, nossos ouvintes
Pois, agora, os lobos são cúmplices
Os pássaros, juízes
E nossa Terra, enfim
Nos recebe como a um traidor

Num beco deita, e espera
Vê, que aquele mesmo se engana
Uma última vez, por teimosia,
A respeito de sua falsa vida
Falsos ombros, falsas vozes
Ainda espera, mas dorme
Não o sono profundo dos que se foram
Mas a insônia convulsa dos que ficaram.


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Escrito no Jardim, em 06/06/2010, às 03:20h.
Ouvindo Sonata ao Luar, Adagio Sustenuto,
de L. van Beethoven.

Imagem por Victoria Francés.

Sobre mais um salto no escuro.
"The world is full of lovers
We don't need anymore"

Frutos


Guarde contigo tuas dores,
como viajante que carrega sua bagagem.
A percorrer um caminho que carece de sentido.

Deixa-as jogadas dentro de si,
objetos abandonados de uso
Incômodo, estorvo, inconveniente.

Lave-os velhos sensos,
com lágrimas novas.
Aqueça teu coração,
com lágrimas quentes.

Pequeno mochileiro,
caminheiro de vagos pensamentos,
sonhador de imensos universos.

Que sentimentos são estes que te pesam?
Sentimentos são assim,
Guarda-os para si e nada além.
Esqueça-os até que podres
Deixem de vingar.

Desabafo


Estou dançando sua doce melodia,
Estou olhando para frente de meu futuro.
Eu tenho um pequeno segredo
Que te faz ficar aqui,
Perdida em meus braços.
É estranho que o amor tenha nos rendido
Estamos andando por entre abismos frenéticos.

A última tempestade já passou,
Existem lágrimas nos olhos escuros de Cupido
Estamos em busca de uma saída
Para fora deste paraíso de nossos corações.

Sonâmbulo eu ando através de seus sonhos
Eu estou ensandecido dentro da sua mente
Eu te possuo aos poucos e de forma subjetiva,
Eu te perdoo em um abraço,
E nos ferimos com beijos tocados de amor e ciúme.

É estranho imaginar que você tenha partido
Mesmo que possa imaginar seus passos
Eu sei que nunca saiu de seu quarto cheio de bonecas
Eu esperava um beijo, mas recebi seu coração.
Eu esperava meu anjo e descobri uma ilusão
Voltando ao passado
Eu te digo: eu te amo!